segunda-feira, 17 de janeiro de 2011

Liberdade

Explodiram... as barragens explodiram!

As águas antes calmas e tranquilas tornaram-se agressivas.

Começaram a percorrer cada canto de mim. Me inundaram.

Levaram na sua correnteza certezas que construí, algumas de tijolos, outras de madeiras e poucas de pau a piquê.

Na verdade levaram certezas que pensei que havia construído, mas não eram minhas... e, por não terem realmente uma raiz, foram facilmente levadas pela água.

A água me bagunçou por completo... dentro de mim estava tudo bagunçado... as certezas foram parar no lugar das incertezas e vice versa... como eu iria me recompor depois de tamanha confusão?...

Fiquei pensando se tinha me perdido de mim...

Depois de muito pensar, percebi que não...

Não poderei me perder de quem eu não fui... de quem coloquei em uma cela por medo... medo de ver a verdadeira face.

Na verdade, eu havia perdido sim, mas eu perdi aquilo que diziam que eu era... perdi a santinha e a malinha que me falaram que eu fui...que eu sou...

Como eles poderiam saber quem sou, se nunca ousaram mergulhar no meu interior para abrir a cadeia na qual me escondi?... como poderiam se eu nunca ousei mergulhar para me olhar... me enfrentar?

Como poderiam saber se jamais souberam que eu me mantive presa todos esses anos só para receber aprovações? só para não viver a ilusão de que não estou só...

Mas só eu sempre estive... estive sempre só naquela prisão e era por isso que sempre me faltava alguma coisa, por mais sorrisos ou choros que eu desse...

Faltava a mim.

Eu tive medo de abrir as celas... mas eu não tive medo de deixar as barragens explodirem de tanto cansaço, de tanta dor... eu permiti, permiti que me explodissem em mil pedaços só para não ter que encarar a verdade... só para não ter que perceber que eu não estivera em mim todos esses anos.

Você tem estado em você todos esses anos ou também espera o caos para se encontrar por ai?

Decidi então mergulhar nas minhas profundezas, correndo o risco de perder o ar, ou me afogar... mas eu decidi abrir as portas da minha prisão...

Pensei que seria fácil... mas quando cheguei lá... quando vi como estava aquilo tudo... o quanto eu havia me prendido, eu comecei a pensar como começar...e cheguei a duvidar se iria terminar.

Então, comecei soltando as correntes mais novas, elas não tinham tanta resistência...

Depois... fui para as meio velhas e percebi que começara a ficar difíceis... elas não queriam ser soltas, tinham medo do que viria pela frente. Tentei tranquilizá-las... mas elas não confiaram em mim, não sabiam quem eu era...

Aliás, nem eu mesma sabia...

Mas consegui por fim soltá-las..

Então cheguei as mais velhas... elas estavam completamente enferrujadas, sujas, mofadas, havia teia de aranha... eu tive muito medo de soltá-las.

Por um momento duvidei se deveria abri-las. Pensei que poderia encontrar dentro da prisão coisas piores que uma teia de aranha... poderia encontrar algo mais fedido que um mofo...

Será que eu deveria ousar?

Ousei...

Levei um tempo... não pense que foi um dia ou dois... levaram meses, mas enfim soltei a última coisa que me escondia de mim mesma...

Soltei.

E então eu vi ali... uma menina, sorrindo... não parecia que tinha ficado presa todos esses anos... parecia que foram segundos... ela tinha e tem uma imensa vontade de viver... de aprender... de percorrer o mundo...

Ela sabe o que quer... mas sabe que sempre quererá mais... é a vida não é?

E, quando eu a vi... achei que iria sorrir... por ter encontrado algo tão bonito, mas pelo contrário... chorei, chorei, chorei...

Desatei em um choro soluçante... duro... difícil...

Mas as lágrimas secaram o que o rio inundou... as coisas ainda estavam meio bagunçadas mas eu decidi colocá-las no lugar.

Agora terei que descobrir cada uma delas... testá-las e ver aquelas que refletem quem eu sou de verdade...

Quem eu sei que eu sou de verdade...

Então... quando eu finalmente me recuperei de mim mesma... de todas as minhas proteções sem sentido eu respirei, como quem estava quase morrendo afogado precisa de ar...

Finalmente encontrei o meu motivo... o mais verdadeiro... para respirar.

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